Fomos ontem à noite ao que achamos ia ser um “open mic” de música indiana num restaurante, com um amigo indiano nosso. Acabou sendo foi um encontro de um grupo de ioga, praticantes do Vaishnavism… ou como o pessoal os conhece, os Hare Krishnas. Mas até aí tudo bem, eles iam tocar músicas, então supostamente estava beleza.

Arrumaram tudo lá, tocaram uma música, mas aí em seguida começaram a cantar o mantra deles. E cantaram a mesma coisa por HORAS. Mudaram os músicos, a letra e a música continuavam as mesmas. E depois da 700a. repetição, não há santo que aguente.

Como tínhamos dado carona para o nosso amigo, que estava lá no meio tocando, não podíamos simplesmente ir embora. Então eu comecei a conversar com uma tiazinha lá e pedi para ela me explicar os princípios básicos da religião deles, pois não conhecia muito. Conversei com ela um tempão, ouvi as explicações dela, fiz muitas perguntas para tentar esclarecer as minhas dúvidas. Ela aparentemente ficou satisfeita comigo como audiência, pois falou algumas vezes para outras pessoas que “he’s got the best questions ever!“. 😛

Depois disso o pessoal de lá trouxe um monte de comida, pararam a música e todo mundo comeu. Eu continuei conversando e perguntando coisas para a tiazinha durante a refeição, mas eu perguntei várias vezes se ela não se importava e ela falou que não, que gostava de falar sobre isso. E parecia gostar mesmo, então não acho que dei uma de chato.

Aprendi montes de coisas sobre a religião deles, mas não fiquei muito impressionado não. No final, o melhor jeito que eu encontrei para descrevê-la é um cristianismo evangélico misturado com espiritismo. Tem todo o lance de criacionismo, da impossibilidade do universo não ter sido criado por um controlador, um deus supremo e todo poderoso, que tem uma forma humanóide definida e que vive uma vida de prazeres e passatempos com seus companheiros. Acreditam  que você só encontra salvação através da entrega total a esse deus, e que se aproxima dele através da recitação daquele mantra. Também acreditam em reencarnação e karma, em vida em outros planetas mais “avançados” ou “inferiores” ao nosso (que é considerado um mundo “médio” em termos de sofrimento e iluminação). Para elas cada pessoa tem uma alma individual, que sempre existiu (i.e. não tem começo nem fim), que fica reencarnando até se liberar da mentalidade “material”.

Uma coisa que achei interessante é que para eles, você tem que ficar com karma ZERO. Você adquire karma negativo e positivo pelas coisas que faz, mas o lance é que se você tem karma negativo, tem que voltar para pagar, mas se tem karma positivo, também tem que voltar, para aproveitá-lo. Só deixa de voltar quando o karma está zerado. Isso eu não sabia, sempre achei q karma positivo era o que importava. Mas um jeito de gastar karma é cantando o mantra, por isso eles cantam aquilo tanto. Para não criar karma, tudo o que eles fazem tem que ser dedicado a Krishna, assim a ação “transcende” o mundo material e não gera karma (e.g. a comida que você faz é consagrada, assim não é mais simplesmente material, não criando karma negativo por causa das plantas que estão sendo mortas).

Outra coisa interessante é que os outros deuses indianos (Krishna é o deus único) são na verdade semideuses, que tem um papel administrativo. São os administradores dos mundos, mas também são mortais. Envelhecem, morrem e podem reencarnar como pessoas “normais” mesmo, ou a gente pode reencarnar com um desses semideuses. Eu perguntei se um semideus reencarnando como um humano seria o mesmo que sofrer um rebaixamento de cargo, mas ela falou que não, que para eles pode ser até uma vantagem pois é mais fácil louvar a Krishna como um humano do que como um semideus, portanto se tornando mais fácil se aproximar dele. Sei lá por que.

Agora os momentos “head explodes”: 😛

Considere o fato da gente depender de água para viver. Agora olhe em volta, e o que tem mais pela Terra? Água! Está aí a prova de que tudo foi projetado por uma inteligência superior.

E para a água do mar não estragar até a gente precisar dela, o deus colocou sal nela para conservar. Daí as nuvens vão, pegam a água, levam para as montanhas, onde elas viram neve e gelo para esperar a primavera, quando derretem e viram rios. Perfeito! Tudo super-planejado.

Além disso, aparentemente ninguém sabe como a nossa digestão funciona, ou como o coração bate, ou como a gente respira. Se ninguém sabe explicar como nada disso funciona, obviamente foi criação divina.

Bom, resumindo, achei o Vaishnavism uma religião em nada diferente das outras. Tinha uma impressão de que seria mais interessante, mas realmente o que mais me lembrou foi mesmo um evangelismo com reencarnação. As explicações que recebi, muitas vezes extremamente fantásticas, como por exemplo quando eles descrevem os passatempos com que Krishna se entretem nas suas horas de lazer, são todas baseadas em afirmações simplesmente retiradas de um texto sagrado e suplementadas com exemplos de fatos “inexplicáveis” que são, na verdade, de conhecimento comum a qualquer um que se dê ao trabalho de abrir uma enciclopédia (i.e. como a digestão funciona).

Esperava um pouco mais deles, sei lá por que. Prefiro o Budismo. 😛